terça-feira, 17 de dezembro de 2013

EMBRIAGADO DE PERDAS



Não existe esta de amor, berrou aquele rosto anônimo no meio da multidão.

Bêbado, tropicando, recolocou um cigarro apagado e amassado no canto da boca. Ergueu a garrafa de whisky, fez um brinde no ar, como se batesse em outra garrafa, e pediu a opinião do liquido dourado que repousava dois dedos no fundo da garrafa.

Né, Joãozinho? Não existe amor, né? Fala pra eles! Amor...mi...mi...mi...Amor...
Só você realmente me entende, meu amigo de todas as horas. Bora caminhar...

Cambaleou, buscou o isqueiro no bolso da calça e resmungou: 

– Aquela vagabunda nunca me amou. Não porque ela não quisesse me amar, mas porque o amor não existe. Se existisse, ela não teria partido.

Depois de tudo que vivemos juntos, das risadas que demos, dos passeios especiais nos fins de semana, dos planos de um futuro compartilhado, filhos, viagens... Como alguém pode te chamar de amor, adormecer nos seus braços, transpirar de desejo e depois dizer que vai embora?

Tive vontade de matá-la quando ela disse que amor não enche barriga...Que aquele convite de trabalho era importante para sua carreira...Que ponte aérea e internet estão à disposição para aproximar as pessoas. Mas ela foi e não me ligou nem uma vez...

Tá, João, se ligou não sei. Não precisa ficar me repetindo isso. De tanto olhar pro cristal do celular esperando ele acender com o nome dela escrito sem que isso de fato acontecesse... Quebrei o telefone.

(…) – Silêncio!

No fundo queridão, eu já sabia que ela não iria mesmo ligar e deu de ombros, como se não se importasse.

Depois, sorriu amargamente. Bebeu mais um gole no bico da garrafa e desatou a chorar. Sentou-se no chão e fez uma oração ininteligível. Vez ou outra era possível ouvir: 

– “Deus me ajude!!”

Os passantes olharam com um certo pesar no olhar. Um mais gaiato soltou a pérola: “Que seja eterno enquanto dure, já dizia Vinícius, meu bom”. Olhou pra trás para ver a reação, sorriu e seguiu seu caminho.

Para espanto de todos, aquele homem de roupas caras, sapatos de grife, ainda que bêbado, surpreendeu a todos com sua cultura e sua verve: 

– “E em seu louvor hei de espalhar meu canto. E rir meu riso e derramar meu pranto. Ao seu pesar ou seu contentamento”. Porque o que queima em meu peito, ainda que me doa muito, será eterno enquanto dure.

Levantou do chão, ergueu mais uma vez a garrafa e perguntou como quem espera resposta: – Bora João? Vamos descer juntos a rua desta solidão?




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