– Não existe esta de
amor, berrou aquele rosto anônimo no meio da multidão.
Bêbado, tropicando,
recolocou um cigarro apagado e amassado no canto da boca. Ergueu a
garrafa de whisky, fez um brinde no ar, como se batesse em
outra garrafa, e pediu a opinião do liquido dourado que repousava
dois dedos no fundo da garrafa.
– Né, Joãozinho? Não
existe amor, né? Fala pra eles! Amor...mi...mi...mi...Amor...
Só você realmente me
entende, meu amigo de todas as horas. Bora caminhar...
Cambaleou, buscou o isqueiro no bolso da calça e resmungou:
– Aquela vagabunda nunca
me amou. Não porque ela não quisesse me amar, mas porque o amor não
existe. Se existisse, ela não teria partido.
Depois de tudo que vivemos
juntos, das risadas que demos, dos passeios especiais nos fins de
semana, dos planos de um futuro compartilhado, filhos, viagens...
Como alguém pode te chamar de amor, adormecer nos seus braços,
transpirar de desejo e depois dizer que vai embora?
Tive vontade de matá-la
quando ela disse que amor não enche barriga...Que aquele convite de
trabalho era importante para sua carreira...Que ponte aérea e
internet estão à disposição para aproximar as pessoas. Mas ela
foi e não me ligou nem uma vez...
– Tá, João, se ligou
não sei. Não precisa ficar me repetindo isso. De tanto olhar pro
cristal do celular esperando ele acender com o nome dela escrito sem
que isso de fato acontecesse... Quebrei o telefone.
(…) – Silêncio!
– No fundo queridão, eu
já sabia que ela não iria mesmo ligar e deu de ombros, como se não
se importasse.
Depois, sorriu
amargamente. Bebeu mais um gole no bico da garrafa e desatou a
chorar. Sentou-se no chão e fez uma oração ininteligível. Vez ou
outra era possível ouvir:
– “Deus me ajude!!”
Os passantes olharam com
um certo pesar no olhar. Um mais gaiato soltou a pérola: “Que seja
eterno enquanto dure, já dizia Vinícius, meu bom”. Olhou pra trás
para ver a reação, sorriu e seguiu seu caminho.
Para espanto de todos,
aquele homem de roupas caras, sapatos de grife, ainda que bêbado,
surpreendeu a todos com sua cultura e sua verve:
– “E em seu
louvor hei de espalhar meu canto. E rir meu riso e derramar meu
pranto. Ao seu pesar ou seu contentamento”. Porque o que queima em
meu peito, ainda que me doa muito, será eterno enquanto dure.
Levantou do chão, ergueu
mais uma vez a garrafa e perguntou como quem espera resposta: –
Bora João? Vamos descer juntos a rua desta solidão?
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