terça-feira, 16 de novembro de 2021

AMOR POR TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA

Por Patrícia Leite 
[16.11.2021]



 

Tenho um amigo que escreve contos eróticos. “Não são pornográficos” – destaca ele de forma respeitosa e elegante, sempre que toca no assunto.

 

Há meses, ele busca um pseudônimo para poder avançar, um pequeno passo que seja, rumo às suas primeiras publicações.

 

Ele é categórico quando diz que jamais vai assinar um de seus contos com o seu nome de batismo. E eu respeito.

 

Não por acaso, para preservá-lo, para manter sua identidade em segredo, a partir de agora, vou chamá-lo apenas de Eros – que de acordo com a mitologia grega –, quer dizer o deus do amor e do erotismo.

 

[...]

 

Mas voltemos ao ponto de partida... Voltemos ao dilema de Eros... Publicar ou não os contos eróticos, eis a questão??

 

[...]

 

Eros confessou que ainda não se sente pronto... Percebo que sempre que possível, ele fica com a cabeça para fora da trincheira procurando a hora certa para avançar.

 

Polidamente, na mensagem de hoje, ele voltou a falar de seus medos. Eu, por minha vez, voltei a insistir.

 

– Publique, homem!!

 

Eros está sempre com uma parte de si camuflada para que o “inimigo” não o perceba saindo do seu entrincheiramento, mas está sempre encurralado entre não mostrar seus contos e a vontade de ter uma opinião sobre o que escreve.

 

Nunca li nenhum de seus textos, até a manhã de hoje. Ele não publica, não os lê em voz alta, não revela nada. Mas sonda as possibilidades. E isso, por si só, já é um bom começo.

 

Esta tarde, Eros me mandou uma mensagem perguntando se eu tinha publicado alguma nova crônica recentemente.

 

Respondi que ando sem tempo, mas franqueei – por julgar que o conteúdo segue atual –, uma crônica de 2013 que eu havia republicado há alguns dias, em um site parceiro.

 

Ao meu ver, ninguém deve deixar um leitor com sede de texto. Não é mesmo?? No fundo, entretanto, acho que fiquei mesmo foi com vergonha por não ter nada novo para oferecer ao meu amigo e por isso enviei um “velho” texto.

 

De certo, posso afirmar que em detrimento da satisfação provocada pela publicação de uma nova produção textual o conteúdo de AQUARELA segue impregnado de verdades atuais e para Eros ele era um texto novo.

 

Um velho-novo ou novo-velho texto que segue me eviscerando, expondo feridas.

 

Por outro lado, preciso fazer uma confissão... Velhos escritos seguem querendo pular para novos textos porque ainda não queimei toda a pólvora. Ainda há tiros para serem disparados sobre temas recorrentes.

 

Isso posto, o fato é que eu não sei dizer ao certo se ando mesmo sem tempo para escrever ou se tenho priorizado pouco o que de fato me faz feliz.

 

[...]

 

Levei um largo tempo pensando sobre isso hoje...Mas...Isso é munição  para outra “contação” de história.

 

[...]

 

De volta as mensagens com meu amigo...

 

Trocamos meia dúzia de palavras, Eros e eu, e num extremado ato de coragem ele me mandou um conto em fase de elaboração e que, na opinião dele, ainda há muito o que mexer.

 

Na minha visão, o texto caminha bem... Anda sozinho, com as próprias pernas, já tem corpo, tronco, membros...

 

Se meu amigo Eros se dedicar um pouco mais o pequeno conto pode ser elevado a “categoria de primeiro capítulo”, rapidamente.

 

 

Em outras palavras, o conto tem DNA para ser livro!! Exclamei isso em voz alta para mim mesma, depois que o li. Mas como ele ainda está dando tratos à bola e disse que o final ainda não foi totalmente concebido,  escrevi apenas: 

 

– Eros,  na minha modesta opinião, o encerramento é o que faz o texto grande ou mediano.  E, por pensar assim, me preocupo tanto com as finalizações. Quando um leitor destaca do meu texto um trecho do encerramento pra mim é a glória, porque me deixa na boca ‘um doce sabor de acertei’.  

Todavia, os textos não andam sozinhos. Se forem jogados desleixadamente uns sobre os outros, apenas ocupando as gavetas abarrotadas do pensamento, não são textos. São apenas sinapses, um impulso e nada mais.

 

[...]

 

Depois de emitir uma síntese da minha opinião, voltei meus dilemas para as perguntas recorrentes que diariamente são formuladas por vários leitores e amigos.

 

 – “O que te inspira?”,  “Como nascem os seus textos?”,  “Quanto tempo você leva para escrever suas crônicas?” “E isso???”, “ E aquilo??” E...E... Mentalmente elaboro respostas.

 

[...]

 

Sei lá... Penso de chofre. Tudo me inspira, acho eu.

 

Me inspira, por exemplo... Amigos fazendo perguntas, intermináveis conversas com meus amores, longas caminhadas, problemas, soluções, dúvidas eternas, certezas temporárias...

 

De repente, dedos correndo enlouquecidos no teclado juntam trechos de pensamentos escritos com batom em guardanapos, risada de crianças, telefonemas inesperados, passarinhos cantando, chuva caindo, cheiro de terra molhada, declarações de AMOR POR PIX...

 

Tudo isso junto e misturado e, vez por outra, cada elemento em seu quadrado me inspira.

 

Não existe a hora certa, medo ou coragem... Não existe o papel certo, a caneta de pena ideal, a cor da tinta predileta [gosto da verde, como Pablo Neruda],  mas uso vermelha, azul ou várias cores ao mesmo tempo...

 

Não importa se a impressora é colorida ou se só imprime em P&B , o MEIO nunca é apenas o MEIO... É sempre parte integrante da mensagem...Mas isso não sou eu que digo... Não é uma formulação minha. Não cunhei essa maravilhosa frase. O mérito é do filósofo canadense Marshall McLuhan. Ele já dizia isso dois anos antes de eu nascer. E ele estava certo.

 

 

Como escrever? O que escrever? Para quem escrever? Por que escrever??

 

[...]

 

Escrevo porque sou fã do que as palavras são capazes de expressar e reter graficamente...

 

Poderia apenas falar ao vento e deixá-las fluir e ser ou não capturada por alguém que as ouvisse.

 

O que é importante no processo? Importante é somar o que eu pretendi dizer com a bagagem de cada leitor. Sua mala pessoal de experiências lançam significado e relevância ao que se pretendeu dizer inicialmente... E isso é mágico... É alquimia sofisticada... Uma pitada ordenada de palavras dando contornos às histórias pessoais de outras vidas.

 

Assim sendo, Eros, meu caro amigo-escritor,  o importante é se lançar no vazio , sem rede de proteção e esperar que as suas frases, palavra por palavra, sejam amparadas por olhos ávidos a correr suas linhas. Se te provoca arrepios, eriça os pelos...Se lance! Escreva! publique!

 

Os dias têm sido difíceis e que bom que ainda há gente com tesão produzindo contos eróticos, poesia contemporânea, prosa-poética e tudo o mais que a viva língua possa despertar de bom na nossa carne.

 

Escrever é desassossegar... E sossego pra que?? Sou uma descumpre regras. A mais legítima das transgressoras.

 

Hoje mesmo, fiz um “PIX DE AMOR”. Usei o mais antigo e tradicional banco brasileiro para subverter a suposta ordem natural das coisas. No comprovante de depósito você poderá conferir o “valor” desse investimento.

 

 Eu te amo e estarei sempre pronta para o que você precisar, disse eu ao fiel depositário do meu melhor!

 

Sim, estou aqui para o que der e vier, meu Preto... Eu sou LA CHASCONA...Choro e poesia... ficção e realidade. Amiga, mãe e mulher...

 

Hoje, eu fui transferência... Só isso... Simples assim!!!