quarta-feira, 21 de maio de 2014

#LUIZ


Por Patrícia Leite
[21 de maio de 2014]



Os ponteiros estavam na vertical, o relógio marcava 6 da matina, o frio era intenso naquele começo de dia. A noite havia sido muito longa, de dor e de espera.

Enquanto se dirigia para a sala de cirurgia, aquela menina vertia dos olhos um misto de ansiedade e medo.

Olhou por cima dos ombros. Uma pequena claridade visível no céu anunciava a aurora e o presente que ela traria consigo. Um quarto de hora depois, lá estava... O princípio de uma nova vida.

Seus pequenos olhos castanhos se abriram no mesmo instante em que seus pulmões se encheram de ar.

Aquele pequenino ser lançou um longo e demorado olhar para a janela de onde se podia ver o céu repleto de matizes de rubro, laranja e amarelo e sorriu.

Num raio de tempo, aquela menina se viu mulher. Foi impossível não pensar nos símbolos ali inscritos. E foi com ele em seus braços que pensou nos sonhos ressignificados.

Na mitologia romana, Aurora é o nome da deusa do amanhecer, mas Aurora também representa um fenômeno que ilumina o céu com cores que variam entre o cor-de-rosa e o laranja. Um espetáculo da natureza trazia para os seus braços um parceiro de todas as horas.

Sem tirar os olhos dele disse: Seu nome não é fruto do acaso.

Sim. Luiz, de fato, é como a luz que surge na transição da noite para o dia. Ele é o instante que nos ofusca, é a expansão da claridade que abre passagem para o despertar de um amanhã.

Ele é o próprio filho da aurora. Meu crepúsculo matinal...razão da minha existência. Ainda hoje Luiz carrega aquele mesmo olhar profundo, compreensivo e repleto de amor.

Sim, meu amor, você modificou para sempre a minha visão de mundo, deu razão para a minha existência, me preparou para as lutas que viriam e me ajudou a vencer cada uma de minhas guerras.

Para compor teu nome escolhi Philipe. Nome que tem origem no nome grego Phílippos, formado pela junção das palavras phílos, que significa "amigo" e híppos que quer dizer "cavalo", e significa “amigo dos cavalos”. Por extensão também é atribuído o significado de “o que ama a guerra”.

Sim filho, você é um homem de paz. Mas, com certeza, não foge a luta. Obrigada por ser este ser maravilhoso na minha vida!!

Feliz aniversário!!







quinta-feira, 15 de maio de 2014

Sob a luz do luar

Por Patrícia Leite




                                          Fotografia: André Meireles Abreu


A lua estava redonda, cheia. Estavam cheias a lua e ela. Ela cheia de gente chata e a lua cheia repleta de admiradores e suspiros. Contrastes...

A música que vinha do Bistrô enchia o ambiente de aconchego e derramava um clima de romance no ar. Os casais de beijavam e fotografavam a prateada bola de luz que pululava na escuridão do céu.

Mas ela não estava para climas de romance. E para ela a noite havia chegado ao fim. Detestava abordagens ostensivas.

Sem o menor pudor, ele encarou-a novamente nos olhos e sustentou o olhar, ergueu uma das sobrancelhas, ofereceu um sorriso e ergueu um brinde. Ela, mais uma vez, ignorou.

Bebeu uma última taça de champagne com as amigas e perguntou:

Como me livro deste chato? Fizeram uma enquete entre os amigos e riram muito das respostas que variaram do bica de uma vez o sujeito ao dá uma chance pra ele...

Ele tá vindo pra cá, disse uma delas.

Finge que não tá vendo, disse a outra.

Vou embora! Depois acerto minha parte com vocês, ok?

Ok, exclamaram em uníssono!!

Andava lentamente até o carro quando sentiu aquela mão impedi-la de dar mais um passo.

Não vá!! – Fique mais um pouco!! Falou aquela voz grave, do alto dos seus quase 2 metros.

Um metro e meio de puro atrevimento e valentia indígena deu-lhe, com uma voz um tanto mais alta que o normal, uma ordem:

Por favor, solte meu braço!!

Ele soltou, não sem antes depositar um pedaço de papel em suas mãos. Olhou-a com aqueles enormes olhos azuis e disse: “só quero a chance de te conhecer melhor.”


Mais uma vez ela o ignorou. Entrou no carro, ligou o som, mergulhou na melodiosa voz de Nina Simone e desceu a rua. No banco do carona a bolsa, um número de telefone e um poema escrito em um pedaço de guardanapo.

Por alguma razão que não soube explicar, olhou pelo retrovisor e lá estavam aqueles olhos azuis, a lua, a poesia de um momento e uma promessa velada.



quinta-feira, 8 de maio de 2014

TECIDOS ESGARÇADOS


Por Patrícia Leite



Sentou-se no terraço daquele antigo hotel e logo suas narinas se impregnaram de maresia. A noite estava calma e um caco de lua se deixou ver.

Prateada apareceu a lua timidamente naquela noite de outono...Mostrou-se, mesmo que pouco, porque foi encorajada pelos cumulus ninbus que bailavam a sua volta. Embriagada de memórias, ela, a lua, cobriu sua nudez e sua vergonha num retalho de nuvens e veio render homenagens aquela  mulher.

Não fosse pelas duas ou três taças de vinho e por estar a observar a suposta timidez da lua, ela talvez não tivesse se lembrado das promessas que trocara na última vez em que ela, a lua, esteve cheia.

Estava envolta em suas lembranças quando uma brisa leve pois seus cabelos em desalinho, arrepiou-lhe o corpo e assanhou seus pensamentos. Seria possível cozer sentimentos esgarçados ????

Dias antes, tendo apenas os astros por testemunha, ele declarou seu amor por ela e partiu sem olhar pra trás. Abriu mão do que sentia por ela e foi descosturando aquele pano especial que os envolvia e os aquecia.

Eles tropeçaram uma vida inteira na barra de suas próprias desventuras...Fizeram casas, e vincos a partir de seus equívocos. Alinhavaram histórias sem sentido. E agora que aprenderam a tecer juntos um pano capaz de transgredir o tempo...abandonaram a linha.

Com medo de dar um ponto, de arrematar com nó, eles se largaram no palheiro da vida. E a agulha que vinha pouco a pouco cozendo a alegria entre eles desapareceu. Arrastado pelas pedras do caminho o tecido puiu, desfiou...furou, esgarçou, rasgou.

Era possível ainda particionar o que restou do pano, bordar, juntar os pedaços e artesanalmente unir novamente aquela matéria prima e com sabedoria fazer uma colcha dos retalhos??
Sim...Porque pouco a pouco descobriram que separados eles eram apenas pedaços, mas juntos eles são a verdadeira arte. Tecido produzido somente pela máquina do amor. 

É DINGUE





O Campeonato Brasileiro de Dingue 2014 foi uma experiência realmente gratificante para estreantes e veteranos. 75 barcos na raia. Emoção até o último segundo. Foi de uma beleza ímpar ver de perto uma classe que consegue reunir um número tão expressivo de barcos na água.
Naquele último dia de regata, o mar transformou-se em um berço singular a acolheu no seu balanço tantos veleirinhos. Estávamos todos em uma raia olímpica, e isso por si só já causava um impacto muito forte. Mas, ainda assim e apesar da ansiedade, tudo era acolhimento e aconchego. O vento foi realmente generoso. Nem tão forte... Nem tão fraco... Apropriado.
Hora da largada. Último dia, última chance de subir algumas posições, derradeiro segundo de buscar o primeiro lugar. O coração acelerado e o farfalhar das velas panejantes davam o tom do dia. Todos, sob um céu azul, de um ensolarado domingão, 4 de maio, esperavam que a CR subisse a bandeira da classe, tocasse a buzina e começasse a oitava e última regata do campeonato.
Cronômetros nas mãos, ouvidos atentos ao disparo sonoro...Barcos correndo a linha... Sangue nos olhos, faca nos dentes, vontade de vencer. Duas largadas queimadas. Foi preciso uma terceira.
A flotilha largou subindo no contravento e todos, por razões óbvias, queriam chegar primeiro na montagem de boia de entrada para o popa. E foi com muita festa na água que – pela primeira vez na história do Brasileiro de Dingue –, que ouvimos os gritos de comemoração porque não foi um velejador que cruzou em primeiro a linha de chegada. Uma dupla feminina venceu o campeonato.
Enquanto a festa das campeãs começava... O segundo lugar dos estreantes parecia escapar das mãos da dupla Patrícia Leite e Luiz Prado que corriam pelo Cota Mil. Brigitte, o barco que carregava o número 4888 e seus tripulantes em segundo lugar, durante todo campeonato, talvez não terminasse a regata. Na montagem da última boia eles foram abalroados e o leme se partiu de uma forma que praticamente impossibilitava a navegabilidade.
Poucas cambadas, um constante trimar de vela, o uso do corpo para orçar ou arribar o barco, foco, paciência, firmeza e determinação...A linha de chegada parecia não ser alcançada nunca, o terceiro lugar estava prestes a ultrapassar Patrícia e Prado, mas o Deus dos ventos reconheceu o esforço dos velejadores do Cota e resolveu que daria um empurrãozinho. Éolo mandou uma rajada que impulsionou o Brigitte.  Nada de extraordinário. O suficiente para cruzar a linha de chegada. Para voltar para o Iate Clube do Rio de Janeiro foi necessário chamar um reboque. Ainda assim, a alegria tomou conta da tripulação. A questão do leme resolveriam depois. Era hora de celebrar.
Enfim, o que foi o campeonato de Dingue 2014? Foi um grande velejar...Seguir ao sabor do vento...Trocar experiências... O que ficou claro, sem sombra de dúvidas é que neste campeonato sobrou emoção para o primeiro lugar, para o segundo, para o último.
Mas o mais importante e o mais belo não foram os resultados finais, foi ver a garra dos tripulantes de uma flotilha que só cresce e que em 2 de novembro de 2015, em Maria Farinha (PE), quer colocar na água 100 barcos. E vamos colocar.
Que os bons ventos nos esperem... Até lá meus queridos amigos dingueiros de todo Brasil.