sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

ELOS

Por Patrícia Leite






















Foto: Priscila Leite – [autorretrato das mãos da minha filha e do meu neto Ravi Leite –10.12.2015]


O *bom dia* veio acompanhado de um sorriso cativante e a carinhosa frase: – Tenho um convite para lhe fazer. Um frio me correu a espinha e depositou-se em um dos meus chacras principais.

Algo dentro de mim anunciava que não era um convite qualquer. E não era mesmo. Era um convite muito especial e comovente.

Senti como se milhões de borboletas voassem dentro do meu plexo solar, pululando do seu lugar de origem e provocando uma brisa travessa que prenunciava que algo importante estava por vir.

Em benefício da verdade, é preciso que eu diga que ando mais emotiva e sensível que o normal e que pude, de certa forma, antever a proposta antes mesmo de ela saltar daquela boca amiga.

Aliás, tenho flanado ultimamente com aquela eterna sensação de déjà vu. Não por acaso, o mensageiro tinha voz de anjo e trazia notícias do lado de lá.

Devagar e segurando minhas mãos, caminhou ao meu lado e sorriu trazendo consigo as palavras emolduradas nos sonhos da noite anterior, pronunciadas por semelhante rosto róseo e parcialmente coberto com cachinhos dourados.

Ela veio, deu o recado e determinou prazo para levar resposta. Era uma ordem, mas o tom era de quem pede singelamente, era manso, era sereno.

Caminhei só por alguns instantes e pensei… Pensei…[…]

Final do ano chegando, confraternizações, correria, muita coisa pra fazer. Repassei mentalmente a agenda: ceia para planejar, compra de presentes para a família, mimos para os jogos de amigos-ocultos e ainda tinha que escolher o presente solicitado na tradicional cartinha dos Correios e Telégrafos e pegar as lembranças encomendadas para as crianças do orfanato.

Comprar, comprar e comprar… E fazer o balanço […]

Tempo de pesar o que realizei, o que ficou pendente e os objetivos para o próximo ano. Pois é… Esse ano seria um pouco diferente. Faria um balancete dos últimos 50 anos. Meio século. Uau!!! O número por si só já assusta, pensei. Rsrsrs…

Ano após ano, em cada Natal, a história se repete com um ou outro detalhe diferente. Um amigo ou parente a menos, um novo membro sendo incorporado a família etc.

Conjecturei com meus botões, muitas e muitas vezes, que o Natal deveria ser de três em três meses. Ao menos o espírito natalino deveria ser revigorado a cada três meses. Mas como aniversário só se comemora uma vez por ano… Jesus Cristo, infelizmente, teria que se contentar com esse clima de amor e solidariedade que ronda apenas o mês de dezembro.

Todavia, apesar do meu desejo, o que conta mesmo é que nesse mês o “Espírito de Natal” está no ar, contagiando a todos, até mesmo aqueles que se declaram ateus.

E, nesse Natal, eu que sou espírita – eu que creio que estamos aqui somente de passagem para honra e glória do Pai, para aprendermos e evoluirmos –, daria de presente algo não comercializável.
Finalmente, daria um 'presente' genuíno. Talhado pelas mãos do criador em pessoa.

POR ONDE COMEÇAR? Talvez na edificação, na escolha da raiz colhida ainda em muda, em outros tempos, em outras vidas.

Quando cheguei por aqui, em 1966, cheguei com escolhas prontas, creio. Escolhi minha missão e como faria para cumpri-la. Tomei essa decisão, antes mesmo de fazer do ventre de minha mãe morada, antes mesmo de saber quando chegaria na recém-inaugurada capital do país.

Escolhi quem seria meu pai, minha mãe, meus irmãos e todos que me ajudariam nessa jornada. Todos que me auxiliariam nessa estrada louca da vida.

Num impulso construtivo resolvi deixar os dedos se moverem sobre o teclado, sem pensar muito no que estava sendo dito ou quantos caracteres seriam usados para contar essa história. Afinal, precisava embrulhar meu presente e colocar-lhe um 'lindo laço'.

Laço?? A verdade é que a única maneira que a alma encontra para “dar um tempo para o aprendizado”, na maioria das vezes, pensei, é quando caímos e nos fraturamos. Laços?? Meu presente seria então 'colar', estava decidido. O material teria que ser forte e resistente as intempéries.

Abri um quartinho de coisas que me foram dadas durante toda minha vida. E me pus a remexer, vasculhar estantes, gavetas, caixas … Procurei até por algo que servisse ao propósito nas pastas do arquivo morto.

Encontrei de um tudo naquele sótão empoeirado pelos anos. Alguns tijolos, ferros, areia, pedras, um pouco de cimento e muita, muita argamassa. Materiais que me foram dados logo de início ainda na minha primeira década de vida e que me foram sendo entregues, em lotes, durante toda minha trajetória. Mas nada havia para o acabamento. Revirei tudo. E não encontrei naaaada para o acabamento. Tudo bem… Entendi que cada um de nós somos uma igreja em nós mesmos. E o templo precisa ser construído continuamente. Nada está finalizado. Obra de igreja não acaba nunca, dizem. Rsrsrs… E é verdade. Somos igrejas em constante reparo e restauração. Por isso, de pronto, entendi o motivo de não haver nada de material para acabamento naquelas estantes.

Não, não sou carola. Mas creio cegamente que para tudo há um propósito. Não creio no acaso. Há em tudo uma razão de ser. Simples assim. Mas voltando ao que interessa…Comecei a pensar em como havia acumulado aquele imenso estoque de material de construção.

Então, lembrei que cedo me entregaram a primeira pedra: papai e mamãe se separaram quando eu tinha uns 3 anos. Depois chegaram toneladas de areia. Fui soterrada pelos descasos, vida corrida, abandono, abusos, maus-tratos, solidão, angústias, medos, doenças e desventuras de todo tipo.

E cada vez que uma carreta me cobriu, elevei meus pensamentos ao alto, orei e agradeci. Também me irei, fiquei de mal com Deus e chorei e berrei e esperneei. E Ele como um bom Pai me dizia baixinho: Só há um único CAMINHO para se sentir pleno. Nunca desvie dele!!

Todos temos tumores sociais. Maridos ou mulheres drogados, doenças sem cura, amputações, espancamentos, fome, miséria…Qualquer um pode desfiar um novelo de capítulos terríveis. Mas as mazelas não são terra boa para germinar o que de fato é necessário.

Mas vou lhe segredar um valioso fármaco. Há um emplasto que tudo cura. E ele é a verdadeira argamassa, o cimento, o que constrói verdadeiramente, transforma. Ele é o sapê que ergue as paredes das casas mais humildes. É também o remédio de todas as chagas. É o colo tranquilo para o repouso dos exaustos.

Não importa quais tombos levei, às inúmeras vezes que derrapei, escorreguei, cai, me espatifei. Importa que todas as vezes levantei. Coloquei esse emplasto sobre as feridas e me curei e me curei.

Certa vez, li que o bem e o mal são duas grandes feras selvagens que chegam para nossos cuidados ainda filhotes. Crescerá aquele que alimentarmos melhor. Escolhi alimentar o filhotinho do bem.

Falar de amor, nos dias de hoje, é considerado brega. Mas eu sou brega e adooooro essa breguice que me habita e sou feliz dessa maneira. E esse é o meu presente muitíssimo brega pra você.

Hoje, quero aproveitar essa oportunidade e te dar o maior presente que a vida me deu. Quero dar pra você. Desejo que você possa também presentear outro com o mesmo presente super brega que estou te dando agora. Não, não vou achar que você está me desfeiteando dando o presente que eu te dei pra outro.

Quero te dar AMOR. Essa argamassa que nos cimenta, nos edifica, nos põe de pé. Eu sou resultado de cada pedra que apareceu no caminho, cada areia que recaiu sobre mim, cada buraco escavado sob meus pés. Porque peguei tudo que me atiraram e misturei com essa liga maravilhosa.

Somos todos pequenas argolas, mãos que somam e formam correntes de cura. Somos apenas pequenos ELOS da criação. Mas renascemos no sorriso confiante do outro. Brotamos mais preparados quando nos alimentamos desse sentimento incondicional.

Olhe a sua volta!! Ser feliz é uma escolha. Procure e encontre. Na maioria das vezes, a menor de todas as mãos, a que parece mais frágil e necessitada é que traz a força e o amor necessário ao nosso resgate.


O único caminho é o amor. É também o mais seguro. Portanto, fé em Deus e pé na tábua!!