terça-feira, 3 de dezembro de 2013

CÁRCERE

Por Patrícia Leite

Dia desses, estava pensando porque as pessoas se põem tanto tempo a me observar. Eles me olham daquele jeito estranho, cenho franzido, aquela cara de paisagem, sabe? Não sabe o que é cara de paisagem? Cara de paisagem é aquela cara que finge normalidade, olhar no horizonte, meio parte do cenário. Agora que você entendeu, continuemos.

Muitas são as caras e bocas do não entendimento que se voltam para mim. Coisa de gente “limítrofe”. Há os que não conseguem disfarçar o seu estranhamento e ficam com face de interrogação, mas os piores rostos são os que transbordam da expressão coitadinho.

Detesto quando eles me olham com cara de coitadinho. Coitadinho são eles com suas vidas medíocres, cérebros atrofiados e uma infinita incapacidade de se libertar das convenções. É fácil entretê-los enquanto passeio, viajo. Basta girar um prato no assoalho e ficar abanando as mãos. Munidos de caneta e papel e todo um arsenal de cientificismo barato se colocam a pesquisar mecanismos de me demover do que eles chamam de meu mundinho.

Eles não sabem nem o que é mundinho, porque se soubessem perceberiam que mundinho é o deles que tem uma delimitação geográfica e chegam apenas onde à ciência conseguiu enxergar. Eu posso ir e vir em caudas de cometas nos mais diversos passeios intergalácticos, posso retornar a vidas passadas, frequentar o futuro, me transportar, andar no tempo.

Se você estiver pensando que isso não é possível, ou que sou louco, está na hora de dar uma estudada na teoria da relatividade, de Einstein. Procure algo em torno do tema universo paralelo.

Mas como eu ia dizendo, os medíocres estão presos em suas próprias amarras e não satisfeitos perseguem-me, implacavelmente, querendo me encarcerar no que eles chamam de padrões de normalidade, interação social.

Desprezo o que eles convencionaram como normalidade. Não sabem eles de sua própria involução. Um de seus principais demônios interiores é conviver com este desconhecido que represento. Uma enxurrada de perguntas tolas ronda suas cabeças. Perguntas erradas, mal direcionadas. Às vezes tenho vontade de lhes fazer um agrado e carregá-los em uma das minhas muitas viagens. Neste firme propósito deixo que alguns deles me toquem, tolero até que usem minha própria técnica de distração coletiva, permito que alguns girem igualmente um prato no assoalho para abstrair os que não quero levar na viagem.

É muito triste o que acontece durante estas tentativas. Eles ficam olhando, de verdade, para o prato, enquanto abanam as mãozinhas. Por mais que eu envie os códigos psíquicos que possibilitam a viagem eles são incapazes de decifrar. Ficam ali parados, ora me olhando, ora olhando para o prato. Vou e volto do passeio e eles ali olhando para o prato. E o anormal sou eu. Tem horas que tento me nivelar com eles e grito, esperneio, bato, unho. Não bastasse meu esforço para me nivelar por baixo ainda me drogam dizendo que estou nervoso, agitado.
Acordei esta manhã com vontade de revelar a chave de todo este mistério, mas eles não estão preparados. Você está? Antes será necessário você abandonar estes seus maneirismos bizarros. Não estou aqui falando apenas de deixar para trás os rituais de repetição. Estou falando de quebra de paradigmas, sem cerimoniais de passagem. Um pulo, um salto no desconhecido, algo como abrir as portas de seu próprio cárcere.

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