quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Há cinza no arco-íris


Por Patrícia Leite


Foto by Amanda Nascimento





Aqui, disse colocando a minha mão sobre o coração dele.

E repetiu a expressão apertando ainda mais a minha palma sobre o seu peito: aqui, oh! Dentro de mim, chove e faz sol!

Os olhos estavam marejados...

Olhei, apenas por um instante. Depois, gracejei para aliviar a pressão: Sol e chuva? Casamento de viúva!

Ri um sorriso torto...

Esse era um maneirismo nosso para dizer como nos sentíamos naquele exato momento. Uma espécie de previsão meteorológica dos sentimentos e do estado de espírito.

Nesse instante, um arco-íris risca o céu, de fora a fora, disse eu com um tom de voz que remetia a esperança de dias melhores.

E há sempre um pote de ouro no final do arco-íris, não é mesmo?

Ele estava triste e eu não estava diferente dele. Era hora de dizer adeus...

De repente, estava eu também fazendo a previsão do meu clima interno.

Refletindo sobre o meu próprio discurso positivista, me dei conta de que o incrível arco colorido não estava a revelar apenas seu espectro contínuo e exibicionista de várias matizes.

Revelava algo que não era dito, mas que estava ali. Era tudo, menos colorido do que desejávamos que fosse.

Acho que as dores são sempre desprovidas de cor. Me parecem ser sempre descritas em preto e branco, disse eu a ele, em um tom mais melancólico do que gostaria.

Não sem pressa estava eu analisando o fenômeno em si. Lembrei da minha professora do primário explicando: o sol quando brilha sobre as gotas da chuva revela multicores que vão do vermelho ao violeta.

No meu caso, o sol sobre as gotas de chuva revela cores que contrastam com os vários tons acizentados em que repousa o meu próprio caos.

Em meus devaneios, eu já não o ouvia mais. Ele estava confuso e eu também. Sequer tínhamos a real noção do por que estávamos dizendo adeus.

Todo aquele palavrório era um zumbido distante que se somava ao meu emaranhado de sentimentos e ideais.

Não, eu não estava completamente em paz com as incertezas do futuro. Mas precisava aceitar o novo, o desconhecido. E, sim, eu posso receber a vida, de braços abertos, com tudo o que ela tem pra mim. Dizer adeus é sempre esquisito. Sempre é!

Virei sobre os calcanhares e comecei vagarosamente a me afastar. Já tínhamos tido aquela conversa antes e não tínhamos chegado a lugar algum.

Olhei sobre os meus ombros e apenas balbuciei: Talvez um dia eu possa te falar do amor que tivemos...Talvez...Um dia, quem sabe?

Agora, eu entendia Vinícius de Moraes. “Que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure”.

Uma lágrima me embotou a visão e todo o colorido subitamente virou aquele cinza escuro dos dias de temporais.

Sim, durou o tempo infinito que tínhamos um para o outro e enquanto éramos o resultado da soma de nós dois, fomos multicor. E ainda poderemos ser… Quando formos sol nas gotas de outras chuvas, para além de nós.



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