sexta-feira, 29 de novembro de 2013

TEMPORALIDADE

por Patrícia Leite

Carregava no pescoço um relógio que, conforme a candência dos quadris, pendulava mais lento ou mais rápido. Esse balançar dava-lhe a falsa sensação de controlar o tempo. Mas esse continuava implacável na contagem regressiva e tiquetaqueava o "semitom" de seu próprio definhamento biológico.

O tempo não é justo. Em detrimento da vontade e da ciência, o tempo não é regular. O tempo é relativo. É lento durante as tormentas e ligeiro, muito ligeiro quando se trata dos momentos que queremos perpetuar.

O tempo, quando é intempérie, é inimigo discreto e exaspera a alma em compassos de pulsos e repousos dramáticos. O tempo eviscera os mais fracos e ostenta os nossos diabos interiores. No contratempo do tempo estão os anjos que esperamos que um dia nos salvem. Mas tudo isso somente no tempo que o tempo quiser.

Sem tempo para o tempo preguiçoso e na ânsia de tudo sorver, há dias em que queimo as passarelas de contato. Em outros, quando me esqueço do quanto o tempo é desonesto e sorrateiro, construo pontes sólidas por cima de rios caudalosos e passeio sem me lembrar da pressa do tempo.

Mas, diariamente, entre um tic-tac e outro, renovo sonhos, busco novas estradas, corro o mundo. Algumas vezes só. Em outras, bem ou mal-acompanhada. O importante, porém, é o movimento. É. construir, desconstruir, começar de novo e driblar o tempo que o tempo pensa que me resta. Porque no fim das contas, quando o tempo atinge o apogeu da própria finitude o importante é o percurso, a trajetória, a linha descrita por um ponto material. O eu em movimento.

Importante é constatar que usamos o tempo bem. Fizemos pausas para enxergar o outro, paramos para um abraço amigo e para dar um beijo. O importante é concluir que estagnamos o tempo todas ás vezes em que o dedicamos ao amor.


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