sexta-feira, 20 de novembro de 2015

REVIRANDO LENÇÓIS


Por Patrícia Leite







































Fotografia: Fernando Alves [15.11.2015] 

                                      
O Relógio tocou, às 4h da matina e, apesar de ter ido dormir às 2h, ela – que tanto detestava acordar cedo , levantou cantarolando. Estava alegre, ansiosa e animada. A vida estava no ritmo de sua urgência, pensou.  

Sim, ela tinha pressa em ser feliz. Jogou de lado as cobertas, vestiu-se rapidamente. Em poucos minutos, estaria nas entranhas da terra, vasculhando, se entrometendo, interagindo.

O sol apareceu acanhando, entre as nuvens, por volta das 5h30, borrando o céu com tons que variavam do amarelo ao vermelho. Uma chuva fina e um vento frio chegaram de repente para colocar em xeque a empreitada do dia.

Olhou a volta, analisou as nuvens, as condições de vento, calculou mentalmente e concluiu: Sim, teria cerca de 8h até que o temporal caísse.

Estacionou o carro no ponto de encontro, cumprimentou os companheiros de exploração e se juntou aos demais membros da equipe. Desta vez, foi sentada no banco detrás do carro e seguiu tecendo conversa fiada com dois desconhecidos. Logo, sentiu-se entre amigos.

Todos seguiram falantes pela BR-020, por pouco mais de uma hora. Mais ou menos uns 120 quilômetros depois, fizeram uma parada para tomar um pingado e comer um pão de queijo recém-saído do forno. Um friozinho correu-lhe a barriga. O destino final estava próximo – Caverna da Jabuticaba.

Sabia que o local ficava logo depois de Formosa-GO, no Distrito de Bezerra, e que teriam que rodar ainda um trecho pela GO-468 até chegarem a mineradora Santana, extratora de calcário e brita, e ponto de partida para um novo dia de aventuras. Ao chegarem na mineradora, caminharam por cerca de meia hora até que todos alcançassem a entrada da caverna.

Ela sabia, antecipadamente, que enfrentaria 1.674m de extensão, por debaixo da terra, segundo a Sociedade Brasileira de Espeleologia. E passaria por vários salões, um deles com aproximadamente 12 metros de altura. Também se preparou para os locais nos quais seria necessário passar só com a cabeça de fora d'água, há um palmo do teto da caverna.

O que ela não sabia é que a maior parte do percurso seria realizado dentro d'água, que em vários momentos o trecho seria profundo demais e que ela teria que nadar numa água extremamente gelada por longo tempo.

Em benefício da verdade, todos tinham sido avisados que a água era fria, que em alguns trechos do lençol ela bateria no teto e que seria necessário mergulhar para passar para outro salão. Mas entre a teoria e a prática há uma grande diferença. E nem bem a expedição começou...Alguém reclamou que estava entrando em hipotermia. Um certo exagero, é claro!!

Mas como se tudo isso fosse pouco... Ela descobriu aos 47 do segundo tempo, que só havia um jeito de sair dali. Teria que engatinhar sobre os detritos vegetais, abrir espaço entre os galhos, folhas e troncos para finalmente, na garganta da caverna, ter que se lançar no vazio.

Sim, no fim da caverna a única forma de voltar para trilha é saltar de um barranco com de cerca de 6 metros de altura, porque não tem como descer escalando, para cair por um tempo que parece uma eternidade dentro de um lago chocolate.

[…] Olhou para o alto, pediu proteção ao pai e saltou. O tempo pareceu não ter pressa, até ela emergir daquelas águas...

Uma chuva fina começou a cair novamente, o céu estava negro e anunciava que o temporal estava próximo. O cheiro de terra molhada e o perfume adocicado da jabuticaba encheram o olfato, bateram no céu da boca, deslizaram pelos pulmões e, ao final de todo esta explosão de sensações, o corpo suspirou, relaxou e entrou em equilíbrio.

A adrenalina agora era apenas uma lembrança boa. Mas viciada em adrenalina, fechou lentamente os olhos, degustou por mais um instante aquela sensação de prazer extremo e começou a desejar o próximo encharque de êxtase.








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