quinta-feira, 3 de setembro de 2015

UMA CHANCE PARA O OLHAR

Por Patrícia Leite





A sociedade contemporânea está mediada por excessos – orientada por hipertextos cênicos e emaranhados de telas que perderam o sentido original ou simplesmente nada mais expressam.

Quem confere significado verdadeiro às figurações é o observador comum, e, este, praticamente, inexiste. O exagero de imagens confunde, anula e automatiza os modos de ver. Em outras palavras, a sociedade pós-moderna esqueceu-se do que é o olhar e perdeu-se de si mesma.

Pitorescas cenas do dia a dia passam despercebidas em meio ao olhar tedioso da multidão. A vida competitiva e efêmera, dos grandes centros, não deixa lugar para a observação natural. E, a chamada "era da informação" de que matéria é feita?

Esta, sem dúvida, é representada por um modelo midiático que oferece espaço, apenas, ao show, ao horror, a corrupção, a violência. Quase todos os espaços estão absorvidos pela espetacularização, embora muitas vezes disfarçados.

Comportamentos modelos não têm lugar nos fatos noticiosos, tampouco na existência das pessoas. Ninguém mais se preocupa com nada que não circunde o próprio umbigo. Os narcisos proliferam por toda parte. Os românticos são repelidos a todo o momento.

Ainda resta espaço textual de expressão para as minorias engajadas? É possível. A crônica – gênero literário livre –, captura por meio do interlocutor o que o capitalismo, antropofagicamente, arruinou.

De certo, que o testemunho histórico e o depoimento subjetivo do cotidiano dissipam-se na fruição do pensamento professado. Mas isto é diferente de engolir o homem, e está muito distante do reducionismo existencial que a precificação humana alcançou na “pós-modernidade”.

Somos todos meros produtos na cadeia produtiva, servindo-se uns dos outros? Pensar sobre o perdimento do homem me fez parar e refletir se, também eu, ainda sei olhar.

Percebi no correr das horas que, uma tarde de observação nos coloca na contramão do percurso da corrida de inserção econômica. O ócio, que delícia o ócio! Ele pode oferecer uma imensa diversidade de contrastes. É possível reencontrar neste ambiente o olhar a muito perdido.

O reencontro é bárbaro, mas não é feito sem dor e nostalgia. Algumas pessoas estão tão distantes dos outros e de si mesmas que sequer concebem a ideia de parar, um minuto que seja, para olhar. As poses, fotográficas ou não, mostram e revelam.
Ao editar as fotos e repassar cada momento, tive a impressão que a natureza parecia ter percebido que, naquele dia, alguém parou para, de fato, olhar. Questionei naquele átimo de tempo se preciso de todos àqueles sapatos no armário, roupas e acessórios.

Percebi que descalça, suada de correr atrás de toda aquela energia, estava uma alegria única e despida. Não há na nova era espaço para o texto livre? Para românticos? Para os simples? – Perguntei-me.

Há! Este espaço reside no olhar. Recanto de domínio pessoal, intransferível, que no limite pode e deve ser compartilhado. E neste contexto peço que me desculpe a razão, mas esta loucura é prazer puro não dá para ignorar. Fiquem vocês, "donos da razão",cativos das imposições sociais pós-modernas. Quero ser livre para olhar, ser olhada e compartilhar. Para isso, não há excesso.

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Excelente o texto... Penso que tb posso parar para olhar e admirar o belo na sua essência. Tb reflito sobre os exageros no meu armário... Sou tb assim meio romântica e meio louca rs... Parabéns, linda e talentosa Patrícia!

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    1. Obrigada, Maria. Noto que há muitas de nos espalhadas por aí. Rs

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    2. Obrigada, Maria. Noto que há muitas de nos espalhadas por aí. Rs

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